Em entrevista à APCER Brasil, Odair Senra, presidente do SindusCon-SP, fala sobre os ganhos em ter uma norma de qualidade exclusiva para o setor, além dos desafios e impactos impostos pela pandemia de covid-19.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP), Odair Senra, concedeu uma entrevista exclusiva à APCER Brasil sobre a importância de ter uma norma de qualidade exclusiva para empresas do segmento da construção, dos desafios e impactos causados pela pandemia de covid-19 - como desabastecimento e elevação desenfreada dos preços dos insumos utilizados nas obras -, além das perspectivas para o setor no segundo semestre deste ano e para 2022.
Recentemente eleito para seu segundo mandato à frente do SindusCon-SP - para o biênio 2021-2022 -, Senra pontua que, em meio a todas as dificuldades causadas pela crise sanitária e econômica que vem se arrastando desde o ano passado, a entidade, conjuntamente com outros parceiros, criou ações significativas de enfrentamento à pandemia, com o objetivo de assegurar a manutenção da atividade e do emprego no setor, bem como a saúde dos trabalhadores. “Recomendações na forma de folhetos, vídeos e palestras foram transmitidas para que os trabalhadores se prevenissem corretamente também em suas residências e nos trajetos. Para mensurar a eficácia dessas medidas, implementamos uma pesquisa semanal no início de maio de 2020. Em sua mais recente edição, a 52ª, a enquete apurou que os níveis de contaminação seguem ínfimos no setor”, conta.
Leia a entrevista completa:
APCER Brasil - O setor da construção enfrentou um período difícil e começou a se recuperar em 2019, ocasionando uma perspectiva de crescimento e de geração de empregos para 2020. No entanto, o País foi atingido pela pandemia de covid-19 logo no primeiro trimestre do ano. Quais foram os impactos que a pandemia causou no segmento da construção?
Odair Senra - O maior impacto de todos ocorreu por conta dos aumentos de preços dos materiais de construção e de seu desabastecimento, afetando significativamente os orçamentos das obras das construtoras. Nos últimos 12 meses, os custos das construtoras com os materiais, no Estado de São Paulo, elevaram-se em mais de 30%, sendo que alguns insumos estratégicos, como o aço, subiram cerca de 70%. As construtoras acabam sendo obrigadas a sancionar esses aumentos, por diversas razões. Nossas empresas têm pouca margem para substituição de materiais, pois estão sujeitas a memoriais, inspeções e planos de qualidade. São obrigadas a seguir as normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). Cronogramas rígidos impedem a postergação de compras de materiais. Restrições de caixa impedem grandes antecipações de aquisição de insumos. E as construtoras precisam estar muito atentas à sua responsabilidade sobre a qualidade final das obras, que, se não for observada, acarretará mais custos com manutenção após a entrega dos empreendimentos. A excessiva onerosidade desses aumentos de preços dos materiais desequilibrou muitos contratos de fornecimento de obras - razão pela qual as construtoras começaram a pleitear o reequilíbrio econômico-financeiro desses contratos. O maior problema foi o sofrido pelas construtoras que realizam empreendimentos no Grupo 1 do Programa Casa Verde e Amarela e que já haviam firmado contratos de fornecimento destas obras com preços fechados para o governo. Se o governo não encontrar uma solução, certamente muitas obras se tornarão inexequíveis e serão paralisadas. Sem previsibilidade sobre o fim desses reajustes, também se criou uma dificuldade na orçamentação de novos projetos de obras. Lançamentos de empreendimentos imobiliários foram adiados. E os preços das unidades foram elevados. Até o momento, as perspectivas para o cenário deste ano são de continuidade desses reajustes até o final do semestre, com uma possível estabilização no segundo semestre. De qualquer forma, o problema afetou negativamente o setor, que hoje tem uma percepção pessimista sobre a situação atual e as perspectivas futuras de seus negócios para os próximos meses.
APCER Brasil - Por outro lado, houve alguma ação que tenha sido implementada durante a pandemia e que tenha trazido melhorias ao segmento e seus profissionais?
Odair Senra - Logo no início da pandemia, o SindusCon-SP, o Seconci-SP (Serviço Social da Construção) e o Sintracon-SP (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção de São Paulo) criaram um Fórum Permanente, com o objetivo de assegurar a manutenção da atividade e do emprego no setor, bem como a saúde dos trabalhadores. Foram implementadas dezenas de ações para conscientizar empresas e trabalhadores sobre a importância das medidas de prevenção nos canteiros de obras, como higienização das mãos, uso de máscaras e dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), além do distanciamento social. Recomendações na forma de folhetos, vídeos e palestras foram transmitidas para que os trabalhadores se prevenissem corretamente também em suas residências e nos trajetos. Para mensurar a eficácia dessas medidas, implementamos uma pesquisa semanal no início de maio de 2020. Em sua mais recente edição, a 52ª, a enquete apurou que os níveis de contaminação seguem ínfimos no setor. Em relação à semana anterior, os casos suspeitos de covid-19 em obras do Estado de São Paulo caíram ligeiramente, de 0,39% para 0,37% do contingente de trabalhadores; e os casos confirmados oscilaram de 0,18% para 0,19%. Pela quarta semana consecutiva, não se registraram óbitos entre as empresas pesquisadas. Nenhum trabalhador estava em internação hospitalar. Realizada entre 13 e 19 de maio de 2021, a pesquisa obteve dados de 50 empresas, responsáveis por 577 obras, envolvendo 38.849 empregos diretos e terceirizados.
APCER Brasil - Como foi recebido pelo setor da construção o Programa Casa Verde e Amarela, criado para substituir o Minha Casa, Minha Vida?
Odair Senra - A princípio, a iniciativa foi bem recebida, por preservar a arquitetura financeira do MCMV, que viabiliza a construção de empreendimentos de habitação popular mediante subsídios, especialmente ao segmento menos favorecido da população. Entretanto, os escassos recursos da União para este segmento atualmente, só alcançam para concluir as obras em andamento. E mesmo estas obras estão ameaçadas de paralisação, por conta dos cortes no Orçamento. O maior problema está sendo enfrentado pelas construtoras que já fecharam contratos de fornecimento de obras ao governo por um preço fechado e agora estão amargando os reajustes excessivos, que causam desequilíbrio econômico-financeiro em seus contratos. Já a contratação de novas obras para famílias de renda mais elevada dentro do programa, está sendo dificultada justamente pelo aumento dos custos das construtoras com os preços dos materiais
APCER Brasil - Para atuar na construção de unidades habitacionais com verba do Governo Federal, a exemplo do Casa Verde e Amarela, a construtora precisa cumprir os requisitos exigidos no SiAC (Sistema de Avaliação da Conformidade de Empresas de Serviços e Obras da Construção Civil), um sistema de certificação de gestão da qualidade voltado exclusivamente para construtoras. Quais outros ganhos o senhor acredita que esse tipo de certificação traga para o setor?
Odair Senra - O atendimento a esses requisitos beneficia tanto as construtoras, que assim atestam a qualidade de seus empreendimentos habitacionais, como os futuros moradores dessas unidades. Além disso, a certificação é mais um estímulo ao setor da construção para modernizar e industrializar seus processos produtivos, buscando aliar inovações tecnológicas à produtividade e à qualidade das obras.
APCER Brasil - Quais são as perspectivas em relação ao setor para o segundo semestre deste ano e para 2022?
Odair Senra - Esperamos que no segundo semestre a escalada de preços dos materiais de construção se estabilize, para que o setor possa tirar o freio de seus lançamentos. Estes deverão resultar em novas obras em 2022. Para tanto, é muito importante que o ambiente de negócios seja desanuviado, com sinalizações como o avanço da reforma administrativa e agilizações nos licenciamentos de obras, também por parte dos governos estaduais e municipais. Entretanto, ainda há um clima de incertezas no ar, tanto em relação à evolução da inflação, que poderá conduzir a uma elevação de juros que desestimule investimentos produtivos, como em relação ao clima político no país. Todas estas variáveis ainda deverão se delinear nos próximos meses, de forma a possibilitar uma visão de maior clareza em relação a 2022.